quem somos

QUEM SOMOS







O Casa Amarela 5B -Jornal Online surge da vontade de vários artistas, de, num esforço conjunto, trabalharem no sentido de criar uma relação forte com o público e levando a sua actividade ao seu conhecimento através do seu jornal online.

Este grupo de artistas achou por bem dedicar o seu trabalho pintorNelsonDias, https://www.facebook.com/pages/Nelson-Dias/79280420846?ref=hl cuja obra terá sido muito pouco divulgada em Portugal, apesar de reconhecido mérito na banda desenhada, a nível nacional e internacional e de várias vezes premiado em bienais de desenho e pintura.


Direcção e coordenação: Maria João Franco.
https://www.facebook.com/mariajoaofranco.obra
contactos:
franco.mariajoao@gmail.com
+351 919276762


Sunday, March 25, 2012

Friday, March 23, 2012

Dia Mundial do Teatro









………………………………………………………

Tel.: 244 839 672 |moinhodopapel@cm-leiria.pt

GPS: 39º44’25.50”N 8º48’03.80”W


28 QUA_ 10h30 e 15h00

Animação Infantil

“Mielo e Farelo” – Teatro de fantoches

Comemoração do Dia Mundial do Teatro

Até aos 12 anos: gratuito

Público em geral: 2,03€/1,01€

Público-alvo: Crianças e público em geral | inscrição prévia

Mínimo 10, máximo 25 participante




Como participação no DIA MUNDIAL DO TEATRO, publicamos um conto de

Miguel Franco

"Os Fantoches do Estroina"

figura que fazia parte do seu imaginário

enquanto escritor e dramaturgo


Era o meu sonho: ir ao Estroina! Um anseio gritante dentre os meus anseios de criança.
“Irás ao Estroina, deixa lá!”
E eu ia ao estroina a sonhar: uma grande cara vermelha, luzidia, toda envolta em clarões de alegria e sonoras gargalhadas, no
meio de fantoches, dos robertos que falavam, que corriam, que dançavam em rodas e rodas saltitantes…Inchavam-lhe as enormes bochechas a tocar uma corneta doirada e vermelha, atirada ao alto, estrondeando grandes sons que me enchiam os ouvidos infantis de um prazer vivo e maravilhoso.
Era a obsessão, a perdida paixão dos meus quatro anos: ir ver os fantoches à barraca do Estroina!
E um dia…
A feira voltara.
Só se falava nela e nos bonecos de barro, nas espingardas de lata, nas lindas bolas de cores variadas que desciam e subiam presas ao dedo por um elástico e nos fantoches do Estroina!
A minha mãe disse:”Amanhã vais ao Estroina, eu digo à Julita.”
Todos os minutos os respirei a pensar naquele instante glorioso.
De novo, a fulgurante corneta vermelha saiu de entre as bochechas pasmosas de força com que dotara o estroina do meu sonho e ouvi as vibrantes gargalhadas e alegrias.
Fui com a tal Julita. Era uma “grande” da minha rua.
Como foi longo o caminho! Ruas negras e compridas, com luzes muito brancas e pessoas que falavam; árvores e poças de água, muitas; e mais ruas se enfiavam a tardar-me o meu encontro, o meu encontro com o Estroina.
De mão agarrada à Julita, ia saltando e muito apressado, muito excitado a caminho do sonho.
No meio de um negrume viscoso, com raros pontos de luz, a Julita parou.
Parei ao lado dela. Olhei-a ansioso. A passos lentos, pusemo-nos à volta de uma barraca de madeira, toda fechada, muito escura e muito alta.
Era ali.
Com o punho fechado, a Julita foi bater umas tímidas pancadas nas tábuas negras.
Eu adivinhava, eu pressentia lá dentro grande fogo de alegria.
Sem notar de onde surgira, veio uma velha ao pé de nós, acachapada num xaile.
“Não é aqui a barraca dos fantoches?” – perguntámos.
Era.
Com a alma toda aberta, eu olhava e já estava começando a amar aquela pessoa, primeira aparição do mundo sonhado do meu Estroina, mas ela estava dizendo que não, que a porta se não abria, que não havia fantoches!...

Meti a barraca negra toda nos meus olhos.
A Julita puxou-me pela mão: “Vamos embora!”.
Fomos deixando a feira para trás. Qualquer coisa ia crescendo dentro de mim.
E a andar nos passos da Julita, perguntei-lhe porque é que não havia fantoches.
-“ Ela disse que o Estroina se enforcou…” respondeu a Julita.
A minha cabeça virou-se a olhar a barraca sumir-se na escuridão.
Julgo que sentia que apenas o Estroina estivesse melhor (qualquer mal lhe tinha acontecido!) lá voltaria eu pela mão da Julita.
Mas não. Cá dentro, muito no fundo do meu coração de criança,uma dor me dizia…que nunca mais veria o Estroina.

Miguel Franco
Leiria, 25 de Março de 1962

Wednesday, March 21, 2012

O "milagre" da criação não pertence aos deuses mas sim ao Homem e à Natureza


INAUGURAÇÃO DA EXPOSIÇÃO DE FOTOGRAFIA DO CONCURSO FOTOÁGUA - DIA 21 DE MARÇO DE 2012, PELAS 19:00

A realizar no Museu da Água - Estação Elevatória a Vapor dos Barbadinhos - Rua do Alviela, 12 - 1170-012 Lisboa

(Uma das fotografias premiadas, que será exibida na exposição:
"Água Abençoada" | Miguel Baganha


Monday, March 19, 2012

Maria João Franco no Edifício do Banco de Portugal em Leiria

"no meu silêncio vejo-te em palavras"
Leiria/Portugal
BRIEF TRAVEL BYTHE WORK OF MARIA JOÃO FRANCO
It is not easy to speak of the work of Maria João Franco, even for those who think they know it in its essence. A work so pungent, abyss of ineffable truths, yells us through its forms part of the history of the world, containing the deepest lacerations of Sisyphean condemnation, tragedies that come from far, from the early days, I do not know where, revealing that life can be made and remade over and over, birth or rebirth, a work that is constructed and deconstructed until the sum of what really matters: a «you do not say, how much I'll find you» — unmistakable and basilar mark of the incessant human search for the possible.eternity.The work of Maria João Franco has a global abstract effect, however, it seems to interiorize some evidence of an academic erudition, denouncing unequivocally, from the outset, an escape from the initiation in order to run freely through an imagetic diversity of a plastic universe very own, shadowy and agonizing. On these canvas, however, Bacon seems to peek. Farreras also, but Maria Franco can do it without losing the basis of their own identity. This point of view attempts to explain the difficulty we usually have to separate the influences, links that are perennial but simultaneously move away (or mixed) by the individual life experience of a peculiar mind — symbiotic fruit, perhaps born between difference and similarity, reflecting on canvas, despite the inherent paradoxes, a telluric and strange force of an anthropomorphic nature. Even when the author represents the aged nudes over its untouched freshness.Maria João Franco can dissimulate, in a splendorous and unique way, fecundity, thus generating, through a plastic poetry, its own inexorable search, where semiotics persuades the spectator to look beyond its own solitude, beyond its own suffering. What our eyes tend to recognize in default, here is generally represented in opposition, witnessing a space which Maria João Franco fills in purity,.in.prayer,.in.intimacy.

Perhaps one day the world (re) know the remarkable talent of this Portuguese and universal artist and concede her the merited place, but, perhaps, only after a creation of a new world, after the noisy cities and false paradigms of our bloody civilization have been destroyed.

MIGUEL BAGANHA



OBRA ENQUANTO VIDA Foi numa espécie de silêncios ensurdecedores que Maria João Franco sobreviveu, emergiu várias vezes, e solta agora, ao expor mais uma vez, o seu grito de intransigência perante as «forças» que carreiram modos, modas, os autores e ordens em vigor, com frequentes violações do trabalho independente, para a constelação internacional, sucesso a termo, porque outras barreiras selectivas e obscuras existirão neste século.Desde longa data que Maria João Franco foi dando prioridade a um discurso matérico e de alguma violência, proferido entre uma abstracção de teor expressionista e a convocação rochosa do corpo humano — ou do corpo simplesmente. Passo a passo, o seu imaginário recebia impressões graves do exterior, da experiência exógena, acabando por devolver às mãos da pintora fragmentos amassados na devida maturação, coisas endógenas, reanimações poéticas da morte e da vida. Tais verdades interiores, sempre em transformação mas nunca em ruptura, contrariavam o terreno minado pela cultura urbana, formações espúrias, filiação nos concursos rápidos ou guerra dos prémios. Com a sua arte reaprendemos algumas versões de valor porventura romântico, até de raiz na memória dos clássicos problematizantes, a par de uma afirmação expressionista (da mesma mágoa) assente mo testemunho de outros renascimentos e no sentido da revolta. A manipulação do gesto, abarcando logo grande parte do campo, entra depois no domínio da pasta, matéria acumulada sobre esboços líquidos. Alguns dos quais parecem despontar propositadamente nas zonas onde a autora preferiu aderir à transparência e por vezes, quando acha necessário conter a catarse, a decisão de aplicar mansas velaturas sobre troncos antropomórficos duros, brutais, escultóricos. Essa aparente moderação lírica avança com um brilho baço sobre aquelas carnações decepadas, de largas texturas e aparência lítica.Esta busca, algo arriscada, passa por matérias e cores sobretudo acinzentadas, exprimindo de facto a pedra da escultura que evoca o corpo, é um trabalho quase contínuo, quase sisifiano, princípio e fim de um todo que também nos pertence, embora sempre nos escape.Anunciada assiduamente pela sua diversidade, o percurso coerente de Maria João Franco parece abalado, sem que as suas bases se ressintam, dado que esse ponto de vista implica diferença, a simbiose entre diferença e semelhança, o que, apesar de todos os paradoxos, confere uma força inusitada a estas massas onde algum fio de sangue aflora, e mesmo nos casos em que a autora representa (na boa memória académica) os nus falsamente envelhecidos na sua intocável frescura.A forma plástica, em Maria João Franco, recupera do espaço da memória, da própria dor, com obstinação, a ideia e a imagem do corpo, mesmo quando este não se aperta entre os limites do campo e se projecta gestualmente no espaço. A liberdade do fazer, no acesso a qualquer metodologia e materiais próprios, não isenta o formador de pensar quais as razões da sua luta, quais as razões do seu objectivo, o que implica a criação ou aceitação de limites ou regras. Maria João sabe perfeitamente essa condição, porque a condição sobra mesmo quando traída com talento. Neste caso, a pintora está sobretudo ao serviço de si mesma, legando a alguém, a verdade da obra ser um destino de vida.


ROCHA DE SOUSA _2010


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Maria João Franco


www.mariajoaofranco.blogspot.com


franco.mariajoao@gmail.com


tm 919276762


Sunday, March 18, 2012

António Canau

Escultura de ANTÓNIO CANAU de 1997 feita a partir de uma ponta seca de 1996

Edições Salvat "Arte contemporânea nº 18", página 119

"Sem título, de António Canau.

As formas potentes de ressonância orgânica desta obra, executada em bronze em 1997, mantêm nos seus aspectos visuais e tácteis toda a força expressiva. Em evolução constante para a expressão do vazio, do volume e do seu ambiente, as tensões entre a forma e o espaço fluem numa simplicidade poética."


Saturday, March 10, 2012

Fundação Bissaya Barreto em Paris /curadoria de Santiago Ribeiro




Bissaya Barreto Foundation meets in Paris, "heritages Surréalistes" from March 30

After organizing, Portugal, the first major exhibition of surrealist art contemporary"InternationalSurrealism Exhibition Now" (Coimbra, 2010)
- which then brought together works by 56 artists from 31 countries -
the Foundation Bissaya Barreto back to support the meeting, this made in Paris,
some of the great names of art that are part of the surrealist movement today.

Again curated by the artist Santiago Ribeiro (Coimbra) this exhibition,
"Surréalistes Heritages," will bring together works by artists from Portugal,
France, United States, Russia, Czech Republic, Latviaand Vietnam.

The exhibition, hosted by Dorothy's Gallery in Paris,
will be inaugurated on March 30 and will be open until April 15.

Paris Surrealist Heritage – Bissaya Barreto Foundation

Surrealist Heritage

Opening: Friday 30th March 2012, 6pm
Duration: 30th March – 15th April 2012

Opening Hours:
Wednesday to Saturday, 1pm – 7pm
Tuesday and Sunday, 4pm – 7pm

Dorothy’s Gallery
American Center for the Arts
27, rue Keller
Paris, 11e
France

Ph: +33 1 43 57 08 51

http://dorothysgallery.com/

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http://www.fbb.pt/__Logos/fbb.jpg
Quinta dos Plátanos - Bencanta
Apartado 7049
3046-901 COIMBRA
T: +351239800400

na Galeria do Desassossego

Thursday, March 8, 2012

DIA da MULHER

Teresa Mendonça



O Casamarela5B decidiu dedicar, hoje ,a sua página
à Pintora Teresa Mendonça,
fazendo jus à sua próxima exposição
e exaltando o seu carácter enquanto MULHER
e o seu talento , enquanto ARTISTA.


Maria Teresa Castro Soromenho Mendonça, nasceu em Ponta Delgada, S. Miguel, Açores,
em 1948.
Pintora autodidacta.
Tendo mostrado desde sempre vivo interesse pelas Artes Plásticas,enveredou pela pintura, referenciando-se na obra de Hilário Teixeira Lopes, da qual sofre forte influência, desenvolvendo assim a sua investigação pictórica.
Colaborou com Sílvia Chicó na realização de uma série de programas para a RTP ”Passeio
pela Arte” produzido pela produtora Artemis para integração da Criança no universo das
Artes.Desde 1996, tem vindo, a participar em dezenas de exposições no país e no
estrangeiro, com incidência nos países lusófonos, nomeadamente no Brasil, Cabo Verde e
Guiné Bissau, em colaboração com diversos Municípios, Embaixadas e Entidades, das
quais se destacam a Sociedade da Língua Portuguesa, o Centro Cultural da Embaixada de
Portugal, na cidade da Praia em Cabo Verde, o Centro Cultural da Embaixada de Portugal
na Guiné Bissau , na inauguração da Reitoria do Instituto Politécnico de Lisboa e em
várias Câmaras Municipais do Continente e Ilhas .
Em 2007, a convite da C.M.de Ponta Delgada expõe “esta cor de memórias feita” no
Centro Cultural de Ponta Delgada em colaboração com o MAC-Movimento Arte
Contemporânea.
Expôs em 2009 na Galeria Pepper’s – Caldas da Rainha e na ARC galeria, em
Faro.
Participa em 2010 na IV Bienal de Poesia de Silves como artista plástica convidada.
Representada em diversas colecções nacionais e estrangeiras, viu , uma vez
mais o seu mérito reconhecido com a atribuição do Prémio MAC – Revelação 2007 Pintura
(troféu executado pelo prof. esc. João Duarte ) pelo conjunto de obras apresentadas por
aquela galeria ao longo do ano de 2007.
Vive e trabalha na Herdade da Aroeira.

A sua próxima exposição abra no dia 3 de Abril no MAC-Movimento Arte contemporânea
na Rua do Sol ao Rato 9C em Lisboa.

Wednesday, March 7, 2012

Rocha de Sousa em destaque








ROCHA DE SOUSA apresenta o seu útimo livro LÍRICA DO DESASSOSSEGO

Pelas 16 horas do dia 17 de Março no Hotel Real Palácio, 115 e galeria Prova de Artista,
rua Tomás Ribeiro LISBOA
apresentação: Prof.Hugo Ferrão
Editora UNIVERSUS









Morri ontem, com a boca cheia de palavras e os olhos tapados de imagens. Na ilusão que me restava, julguei-me renascida, em silêncio, para o suave cuidado dos outros, mortalhas limpas, mãos tratadas, ceroulas descartáveis tendo em conta eventuais incontinências durante a viagem. A vida é reles vista de fora. Lá estava o cartaz com a boneca nua, Agosto rasgado, a cadeira de pau santo com o gato, Clot, oferecido por uma vizinha esquizofrénica, toda arranhada, a boca sempre aberta num choro convulsivo, gengivas de fora, rosadas, pálidas, tumefactas, quatro dentes desalinhados e alguns outros, soltos, no maxilar inferior. Aftas, eu sei, ela sofria muito de aftas, andava todos os dias com um frasquinho de Piralvex na algibeira. Cheirava a alho à sua volta, bafo maior, bagas esmagadas na pedra da cozinha ou raspas sobre raspas para medicar os molhos do bife. O duque, marido não sei de quem, tinha igualmente aquela mania silvestre, presumindo que se defendia assim de suspiros, vampiros, encantos soezes dos males e modas na televisão nocturna, fantasmas promíscuos em casas assombradas, talvez como vinagre nas cenas onde as moscas fustigavam falas ou ombros desnudados. Casas velhas, sombrias e húmidas, casas de velhos trapos, só a Maria tocava no vinagre, ficara com o hábito desde Angola, porque lhe haviam dito que dessa maneira afastaria sempre os mosquitos, os de lá e os de cá. Um país pequeno tem irremediavelmente os seus pequenos mosquitos. E cheiros. Quando abriam a porta, esses cheiros dobravam, urina dos gatos, caca dos cães, indiciação rio apodrecendo na margem direita: apesar disso, ontem mesmo, com gente a entrar e a sair, todos teimavam em fazer de mim uma mulher virtuosa, de súbito com a beleza resgatada, cabelos encaracolados a preceito e uma seda espalhada por cima das mamas moles, barriga inchada, pernas engelhadas. Claro que o cheiro do lodo entrava sobretudo pela janela meio aberta a fim de afugentar o bafio da minha morte, aliás irrelevante se comparado com os perfumes daquelas mulheres magras que tagarelavam nos bancos de madeira, incómodos, gente patética, de ilíacos salientes, outrora dividida pelos amigos do chefe das Finanças, por vezes mais dispersa e pequena, fonte de amantes dos estivadores em Alcânara. Os estivadores mais antigos, aqueles que destilavam um suor vivo, azedo e cálido, todos os que, anos e anos atrás, ainda não haviam sido promovidos a pilotos de máquinas pesadas, fortes empilhadoras, gruas e guindastes, brinquedos que o Clot já telecomandava, metido na almofada para as dores lombares. Que desperdício, a almofada bordada pela minha avó. Ainda vejo as suas mãos recobertas de sardas, um pouco gordas mas de fina agilidade, usando linhas brilhantes que engatava em agulhas de máquina, furando e desfurando um linho bendito, esticado num bastidor de escala amovível.
Se morri ontem, ou na madrugada de hoje, ainda não chegou a hora dos meus amigos, honrados e já com gorjeta, dedicarem um tempo à leitura do meu testamento, uma página vulgar, sem linhas, onde achei por bem escrever algumas vontades, poucas, seguidas do elenco de pequeníssimos objectos de certo valor, memória daqueles anos de ilusão e fome. E as túnicas que absorviam tetas e barriga, um cair até aos tornozelos, romano, imperial, próprio para desenvenenar a vida e a melancolia falsamente cosmopolita de Lourenço Marques, colonial até ao pescoço, com senhoras que arrastavam carregadores ajoujados ao peso das malas. Era uma cegueira pelo saltinho à África do Sul, picando o chão híbrido com sapatos pongteagudos à frente e atrás, certamente brancos, traçados por faixas aos pares, dedos de unhas pintadas, encavalitadados pelo frio que sobrava das piscinas e das normas patéticas, apertadas, publicamente irreprimíveis, instauradas num grotesco espavento de classe.
Quando me lembrei desse comportamento ilusório e mesquinho, reparei de novo na ausência dos meus filhos. Um já é bem grande, outro mais pequeno, ainda alourado, que estuda arquitectura mas não cessa de viajar. É de uma geração ainda africanizada pelas tonalidades do sul, gente das motas, dos carros, castigadora do corpo e emigrando, com a bebida, para temporadas de estudo em aldeias remotas da Índia ou para recolhas de mestrados sobre o desenvolvimento do terceiro mundo. Agora queria chorar e não posso. Talvez eu tenha sido a mãe ausente, sonhando pela pintura a gravidez dos bosquímanos, bebendo e bebendo até saber que jantar me faltava cumprir. Médico, o Ilídio, meu marido, depressa fechou a porta da assistência medicamentosa e o pesado incuprimento de um sexo menos longínquo. Ainda ontem pensei nele. Sentia muito frio dentro de mim e a Europa fica cada vez mais distante das Terras do fim do Mundo ou da antiga Cidade da Beira. Os meus próprios amantes, os mais esbatidos e os que me espreitaram como ornamento, ou estão já mortos ou acabaram por esquecer o nosso melhor tempo abjeccionista. O último marido institucional, a quem estive mais tempo ligada, o Ilídio, voava de congresso em congresso, parava dois dias em Portugal para ver os avôs, e eu quase desaprendera a data (ou as datas) do seu regresso. Ele trabalhava muito. Mas, além disso, já percebera o nome, a quantidade e a qualidade dos meus devaneios. Foi então que me deixei encalhar em cavalheiros de oportunidade, o melhor demasiado activo em ficar com os meus quadros (cada vez menos) e o outro perdido em gentilezas provincianas, capaz de tratar da cozinha e soprando o pior mau hálito que se possa imaginar. Era
tonto, comunista, ocupado, deixou-me de pé à esquina de Paço de Arcos, apropriadamente, com casa e sem um cêntimo. Como poderia apelar aos meus filhos? Parecem nem sequer usar telemóvel, nem papel, nem palavras. O que esteve na Dinamarca comprou uma mota Honda e levou para casa uma moça de belo recorte. Diz que essa é só uma parte da base para o sucesso. E se calhar tem razão? O outro, mais novo, desaprende o português e escreve mails sem conta para terras bem longe da Nova Zelândia. Fala pouco, fala de longe, talvez seja timidez. Chorar é um remédio precário e por vezes não passa da mentira que acumulámos dentro de nós. Mentir, aqui, é
dizer a verdade. Enfim, eles estão lá, eu morri aqui.

Não vejo nada. Ou as imagens que vejo não pertencem ao quadro que me rodeia. Sombras, o punho de uma camisa. Murmúrios sempre, mas isso já me acontecia em vida. Ouvir nunca foi o meu forte, mas era sobretudo uma questão de conveniência e de fraca auto-estima. Há um ruído mais espesso longe deste espaço: julgo perceber que se trata de manobras no porto, atracamentos, guindastes, torpor de motores. Eu oiço sobretudo com os olhos e cheguei porventura áquele instante em que não posso escolher as imagens e o sentido delas. Estou a lembrar-me do Clot, coitado, e nem sei se fugiu, se alguém o terá adoptado. Era um grande companheiro e dormia comigo numa cama japonesa, emplumada. Também não posso expelir as palavras que me enchem a boca, apesar de pensar que são minhas, testamentárias ou lidas em páginas azuis de despedida. Como nos filmes antigos. E os olhos, em nesga, talvez atados por Deus a uma cegueira como aquela que Saramago inventou, apenas captam movimentos preguiçosos, o fundo ilusório da caverna de Platão, entre fracturas onde passam gaivotas e um vago jardim com grande árvores e muitos pombos tratando da vida. É pouco para fechar uma vida ou mesmo a porta da rua de qualquer casa.
Há pouco, num zumbido de orações, vieram tratar-me do caixão. A minha vontade era dizer-lhes que não fizessem nada, que me deixassem ali, num grande sossego, tapando tudo, devagar, incluindo a descida à terra e o encobrimento desta cápsula de madeira envernizada de perfumes. Se calhar é disso que se trata, um ranger de pregos arrancados não sei donde, chaves de fendas chafurdando no encaixe das pegas metálicas. Cristo teria apreciado um serviço assim, alguém que logo o descravava da cruz, lhe desenrolava as cordas, dizendo-lhe ao ouvido que ninguém sabia do lugar para onde o levavam: aó seria lavado, curado e induzido no sono. Mais tarde, não sei exactamente em que altura, houve quem falasse em ressurreição, os mortos resgatados do céu ou do inferno, os santos redimindo as suas faltas, a sua vida inicialmente idiota, revendo o mundo, olhando os seus companheiros de outrora. Nãi sei bem, tanto mais que morri ontem. Mas este trato com o céu, trajectos entre o além e o aquém, tudo isso me faz confusão, não me deixa pensar nem fazer as últimas escolhas. Não vejo os mortos, reinvento os familiares. A minha mãe podia representar, e bem melhor, o papel da senhora de Fátima, com a vantagem de unir o sentido dos segredos à bondade humana oferecida aos povos deslocados de África. Meu pai, entretanto atarracado e com uma orelha cortada, como van Gogh, desenhava casaa e ralhava comigo, dizendo que eu não ligava nada ao estudo e me tornara leviana, com desejos compulsivos, egoista, incapaz de aperfeiçoar desenhos, cópias, rascunhos, pinturas. O meu irmão, sonso e tímido como um herdeiro sem trono, juntava os bicos dos pés e escondia o sorriso que lhe fazia tremer os lábios. Olhos redondos, amaciados, sonsos como os da Gioconda.

Risquei papéis durante toda a minha vida. Quase até ontem. Não tinha forma de os riscar mais e bem. Por isso os rasgava em muitos pedaços, acabando mais tarde por colar esses formas umas à outras, umas sobre as outras. E tudo me parecia o interior da minha cabeça, sombras, escovas e rolos para o cabelo, verniz das unhas, dedos sangrando, os espinhos que ornamentaram a cabeça de Cristo, pequenos animais a andar de lado, como os caranguejos, e as conchas e a água dourada, e as pedras roladas, coisas afinal femininas, apesar de meu pai insistir no estado em que me via, no desapego de mim — mulher excessiva e masculina na aprendizagem da sexualidade, atravessando flores e a própria família, óbvio ramo que não era dele, viera dos sonhos e lendas de minha mãe, dourada sempre, lenta, de olhos azuis, lenta e triste, penalisando-se de coisas que o destino já apagara, bordados, linhas, aguadas, alunas como filhas debruçadas sobre os bastidores redondos, a picar mensagens relativas à benaventurança e ao direito das gentes à vida e à paz. Parece uma visão de anjo mas não é — e ela não tinha asas, teria mais tarde, presumo, mas acabou por morrer, incompreendida, com as pernas roxas, o coração enleado em defesas orgânicas, vasculares, enquanto o fluxo diabético, abissal, se foi tornando incontrolável, a par, por fim, da falência dos orgãos estruturais.

Estou a caminho do cemitério, não sei onde, mas estou morta e sinto-me tranquila. Os anjos são masculinos ou não têm mesmo sexo? Minha mãe percorria as senzalas e procurava, de uma conversa vulgar, criar sinais legíveis sobre a vida, a família, os filhos, a história dos povos, o seu papel no mundo. Era um catoliscismo sem pompa nem circunstancia, não dependia da missa nem de outras liturgias. Talvez ela tivesse reencarnado de um verdadeiro missionário.
Agora sim, estão a baixar o caixão, nave estreita e em madeira, que entra na terra fresca da cova e aí fica, autónoma. Choram não sei bem onde. Pasadas de terra começam a cair sobre o meu rosto protegido. Mas é como se a minha boca fosse bloqueda, completamente entulhada de papéis e terra. Nos olhos, agora, só passam, contra o escuro, imagens fragmentadas de gente conhecida, familiares, tios, primos, amigos correndo, ao longe, como se holofotes rasgassem a noite e mostrassem, só por instantes, um rosto espantado ou um animal a correr. Nesse minuto nunca vi nenhum anjo, nem pessoas que conhecera através de velhos retratos.
Pela primeira vez em muitos anos, não sinto o corpo. Esta suspensão é irrepreensível. Será este o lado sensível da alma? Apenas tenho a certreza de que morri ontem. Ou hoje de madrugada.





::
Rocha de Sousa é hoje um dos maiores escritores portugueses configurando uma poética muito própria que faz da sua obra escrita um valor singular e único no panorama literário.


Importante,assim,se torna conhecer e reconhecer a "escrita" deste Grande Homem da nossa cultura.

Thursday, March 1, 2012